Alexandre Souza resenha o livro “Contos do Crepúsculo e do Absurdo”, de Alessandro Reiffer


Contos do Crepúsculo e do Absurdo” é o primeiro livro de contos do autor, e é uma constante narração de um Alessandro Reiffer que mais parece um personagem dele mesmo.
Com todos os contos narrando uma história em primeira pessoa, não sabemos o limite entre personagem e autor. Muito semelhante ao modo de narrar de Edgar Allan Poe, onde predomina como plano de fundo da narração uma opinião sobre a realidade, que no caso de Alessandro Reiffer é apocalíptica.
Viajamos em sua mente através de histórias fantásticas, ambientadas em nosso próprio mundo, mas que sugerem uma visão bastante sugestiva de nossa decadência. Tanto que o leitor desavisado, não acostumado aos contos de Alessandro, pode chegar à conclusão precipitada de que trata-se de um escritor esquizofrênico. O que o próprio autor menciona em seu conto “A Marcha da Morte”:E vi, como um relâmpago de intuição, que a esquizofrenia, por exemplo, era muito semelhante ao que eu passava, mas que em um âmbito exclusivamente interno”.
Porém, o que é quase certo mesmo em seus contos, é a maneira que ele encontrou de professar seu estilo de passar ao leitor suas opiniões sobre a nossa sociedade decadente, principalmente a grande massa inculta que não se interessa por literatura, o que diríamos então pelo seu próprio livro! Um tapa na cara da futilidade contemporânea. Veja, por exemplo, a narração que ele fez de um convite que ele recebe de uma assombração no conto “O Convite da Assombração”: “A humanidade não tem futuro, e logo não haverá mais motivos para se fazer literatura. Vem, abandona a civilização e junta-te a nós. Junta-te a nós!”.
Você certamente diria que trata-se de um louco, mas Alessandro Reiffer é mais que isso. Ele é um escritor com influências de William Blake, outro escritor que no passado foi considerado louco, mandado para o hospício, e hoje é considerado gênio, e para alguns até um profeta. Mas, se pararmos para pensar, o que tem de normal nessa sociedade além do fato da sociedade não achar normal o que não se inclui em seu sistema de se viver? Parece irônico, mas o próprio autor não faz a mínima questão de ser normal, como admite em seu conto “A Floresta Maligna”: “...Era uma região estéril, improdutiva, que repeliria qualquer ser humano normal. Quanto a mim, não sou um ser humano normal”. Ou ainda em seu conto “Conto Grave de Catástrofe, Sangue e Vinho”: “... agora narrarei minha história, a de um louco completo, sem nenhum cabimento...”.
E sem nenhum cabimento são suas histórias. Tem-se a impressão de que você entra num mundo fantástico povoado pelos mais estranhos seres e acontecimentos improváveis, mas que, no entanto, trata-se da própria realidade! Uma realidade distorcida, onde somos animais e monstros, loucos caminhando em um mundo de ilusões. Uma realidade que pessoas mundanas demais ignoram, vivendo num mar de futilidades sem fim, onde predominam a inveja, o caos, a violência, a depravação, a falsidade, o absurdo! Onde somos monstros que nós mesmos criamos, como os monstros de seu conto “O Louco”, quando dizem: “Nós somos o futuro da humanidade, somos criações de vocês, somos vocês mesmos”.
E assim permanecemos surdos, mudos e cegos perante à nossa própria autodestruição. Veja, por exemplo, como Alessandro Reiffer inicia seu conto “Conto Grave de Catástrofe, Sangue e Vinho”: “SOMENTE UM IMBECIL não percebe que a humanidade caminha, em passos firmes e decididos, rumo à autodestruição”. E assim, somos felizes? Vamos à praia, parque de diversões, festas, etc... Mas... somos felizes? Ainda neste mesmo conto ele diz: “Afirmo que metade da humanidade é infeliz, e a outra metade finge não ser, para si mesmo e/ou para os outros”. E aí vem a grande chave desse problema. Somos o que somos para os outros, sempre para os outros, e nunca para nós mesmos.
Sendo assim, quando pensamos que somos alguma coisa, mesmo ricos, na verdade não somos nada, porque vivemos em função dos outros. Seria esse o nosso trágico fim? Como no conto “O Fim Trágico”: “Os homens, neste estado em que se encontram, não são nada. De onde vocês tiraram que são alguma coisa?...”.
Enfim... seria o próprio Alessandro Reiffer, nos contos, um personagem dele mesmo, ou uma extraordinária invenção de seu ego?
Não importa, pois este livro nos traz uma leitura divertida e interessante sobre uma realidade apocalíptica, como se já vivêssemos em um mundo que já foi destruído, com seus monstros e realidades absurdas.
Um leitor de visão e um livro de imagens impressionantes, isso é o que importa para um entretenimento literário como este, que leva até para os desinteressados um interesse subconsciente pelo des(conhecido).

Nota do Editor: Alexandre Souza (Arcano) é editor do fanzine de literatura soturna “Sombrias Escrituras” e webmaster do site www.sombriasescrituras.z6.com.br